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10-01-2006

A estratégia agrícola portuguesa alterou-se radicalmente


Editorial - Toda a atenção é pouca

A última semana fez aparecer um problema que não imaginava possível neste Portugal democrático.

Desta vez, anuncia-se uma maior penalização para as terras de cultivo abandonadas. Aparentemente, a ideia não parece errada, pois favorece quem não despreza a terra e a protege, cultivando-a e tratando-a, seja para o seu próprio sustento, seja para seu rendimento.

Não é uma ideia inovadora, nem sequer em Portugal (leis das sesmarias 1375, 26 de Maio, Rei D. Fernando), pois já os nossos antepassados reis o fizeram (e não era uma coima - era um castigo). Infelizmente, da necessidade de colonização do interior da nação e do efectivo progresso da lavouro, ao tempo dos nossos ancestrais, à mera fobia pela fácil receita dos nossos actuais governantes, vai uma distância descomunal. Apenas se pensa na receita e de como arrecadá-la rapidamente e não na necessária sustentabilidade da agricultura ou na fixação das populações na actividade que nos dá de comer.

Depois da entrada na CEE, a estratégia agrícola portuguesa alterou-se radicalmente para se adaptar à conveniência dos excedentários franceses. Passaram a pagar o abandono das culturas e sua substituição por outras, para as quais não havia, nem a adequada formação nem a suficiente motivação. Fomentaram a não produção de leite, promoveu-se o levantamento de culturas, mas não se criaram alternativas que valorizassem as terras sacrificadas.

Por isso, é estranha esta lei, até perversa. Parece fazer parte do final dum plano maquiavélico de alteração da propriedade em Portugal. Se muita terra está indevidamente abandonada por incúria e desleixo dos proprietários, a maioria está por responsabilidade da política agrária portuguesa nas últimas décadas e pelo êxodo forçado das populações para as cidades.

Por isso, deveremos desconfiar desta lei e combatê-la sem quartel.

Se conjugarmos este decreto com as taxas imorais e abjectas que as novas avaliações resultantes da aplicação do IMI (imposto municipal sobre imóveis), e que começamos agora a sentir pelos valores quase obscenos que teremos de pagar, talvez se perceba a cuidadosa preparação dum surdo e perigoso ataque à posse dos bens no nosso País. Não sou bruxo nem profeta, mas parece-me que pelo menos vale a pena reflectir sobre este ponto de vista com uma perspectiva de longo prazo. A propriedade é sagrada e um dos bens mais importantes de cada um de nós. O que conquistámos ao longo dos anos serve de reserva para uma aflição na vida a para uma oportunidade de negócio mais galharda. Era assim com os pinhais se bem se lembram. Ao invés de provocarem a mudança de mãos da propriedade para fins naturalmente imobiliários e obscuros, (que é o que vai acontecer), o estado deveria criar condições de acesso aos terrenos, investir na defesa da floresta, avançar na rega das regiões interiores e quentes, proporcionar a alteração de cultivos menos adequados por outros mais rentáveis ou por pastorícia. A isto chama-se investir e aproveitar o dinheiro dos contribuintes. Lançar impostos obtusos e avulsos chama-se delapidar e, em alguns casos, até roubar.

É um dos temas, que pela sua importância, seria bom que os candidatos presidenciais tratassem na campanha eleitoral. Este é um tema estrutural para a vida da Nação. Aguardemos se têm coragem.

António Granjeia*
*Administrador do Jornal da Bairrada


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