«Sempre que no Parlamento se levanta a voz plangente dum ministro, pedindo que cresça a bolsa do fisco e se cubra de impostos a fazenda do pobre, para salvação económica da pátria, há agitações, receios, temores, inquietações, oposições terríveis, descontentamentos incuráveis. O povo vê passar tudo, indiferente, e atende ao movimento da nossa política, da nossa economia, da nossa instrução, com a mesma sonolenta indiferença e estéril desleixo com que atenderia à história que lhe contassem das guerras exterminadoras duma antiga república perdida. (...) Temos um déficit de 5.000 contos. Esta é a negra, a terrível, a assustadora verdade. Quem o promoveu? Quem o criou? De que desperdícios incalculáveis se formou? Como cresceu? Quem o alarga? É o governo? Foram estes homens que combatem, foram aqueles que defendem, foram aqueles que estão mudos? Não. Não foi ninguém. Foram as necessidades, as incúrias consecutivas, os maus métodos consolidados, a péssima administração de todos, o desperdício de todos. Depois, as necessidades da vida moderna, de terrível dispêndio para as nações. Como na vida particular, cresceram as superfluidades, o vão luxo, o aparato consumidor, mais precisões, mais gastos, a vida internacional tornou-se tão cara que mais ou menos todas as nações estão esfomeadas e magras. (...) O défice tornou-se um vício nacional, profundamente arraigado, indissoluvelmente preso ao solo, como uma lepra incurável.» Eça de Queiroz (in “as farpas”) Tropecei neste trecho de “as Farpas” e não resistia transcrevê-lo. É do nosso virtuoso Eça de Queiroz. Esta visão do “monstro” não evoluiu muito, mesmo passados cem anos. As farpas de Ramalho Ortigão e Eça de Queiroz continuam, infelizmente, tão actuais, que até dói a quem lê estes textos cheios de uma acutilante beleza crítica. Entretanto, para além dos anos que passaram desde o tempo de Eça, sucederam-se mais uns dias cheios de sol, com mais uns anúncios do governo e mais umas rocambolescas trapalhadas. Parece, afinal, que Santana Lopes não detinha o exclusivo das confusões, das nomeações, das reformas, dos tachos, das intrigas partidárias, etc. O ministro das finanças, por exemplo, continua na senda das ambiguidades. A perfeita incapacidade de gerir politicamente os acontecimentos ficou mais uma vez demonstrada na entrevista que deu à RTP2, no dia 31. Não conseguiu dizer nada de concreto. Ficámos a saber que iria promover a avaliação do mérito na função, mas só em 2006. E eu que pensava que já existia! E por que não começar já? Quanto ao mérito próprio de acumular reformas nada tenho a opôr. Se ele acha que tem direito a dois ordenados, quem sou eu para o contrariar? O que eu não percebo é quanto o ex-vice governador do Banco de Portugal ganhava por mês, para que um fundo de capitalização do mesmo banco consiga pagar 114000€/ano, só com 6 míseros anos de desconto. E quem pagou? Todos nós, claro. É a velha máxima “ou há moralidade ou comem ? alguns.” E Portugal onde fica nisto? Os dados revelados pelo Eurostat mostram que Portugal estava abaixo da riqueza média de todos os Estados da antiga União Europeia e dalguns dos novos países do alargamento (casos do Chipre e Eslovénia). O gabinete de estatísticas europeu fez comparações entre o poder de compra de vários países e concluiu;. - O Produto Interno Bruto por habitante, em Portugal, situava-se no ano passado nos 73% da média dos actuais 25 países.
- Em Espanha a riqueza produzida por habitantes está muito próxima do valor médio da União Europeia, nos 98 %.
- Abaixo de Portugal restavam a Letónia, a Polónia, a Lituânia, a República Checa, a Hungria e Eslováquia.
- O Luxemburgo tem uma paridade de poder de compra três vezes superior à de Portugal.
António Granjeia* *Administrador do Jornal da Bairrada |