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03-09-2004

"Na estrada não se pode inventar", diz acidentado


Motociclismo: GP Portugal

Diogo Parreira é um jovem entusiasta das duas rodas, "especialmente a mecânica e as peças", mas só coloca a hipótese de dar "um voltinha curta" de moto, após o grave acidente que em Abril lhe provocou um traumatismo crânio-encefálico. "às vezes pomo-nos a inventar e isso dá mau resultado. Na estrada não se pode inventar. Estes dois é que sabem andar de moto", disse Diogo, um dos quatro internados no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão (CMRA) devido a acidentes com motociclos, com os olhos postos no brasileiro Alex Barros e no italiano Max Biaggi. Os dois pilotos do Mundial de motociclismo de velocidade, que domingo disputam o Grande Prémio de Portugal, no Estoril, visitaram hoje o CMRA com o objectivo de contribuir com alguma energia para o árduo trabalho de recuperação dos cerca de 120 utentes internados no estabelecimento e dos que frequentam Alcoitão em regime ambulatório. "Até sou capaz de dar uma voltinha - se algum amigo tiver uma moto nova -, mas só se for curta, uns 100 metros. à estrada não volto", concluiu Diogo, de 23 anos. Diogo Parreira é um dos cerca de 5.000 portugueses que todos os anos escapam ao assustador número de 1.500 mortes nas estradas, mas que se vêem a lutar contra lesões graves ou irreparáveis, originadas por acidentes de viação, que lhes minam a autonomia. Os problemas mais frequentes com que se deparam os profissionais de Alcoitão, segundo a sua fisioterapeuta-directora, Margarida Avillez, são traumatismos crânio-encefálicos ou contusões vertebro-medulares, mas "tem havido um descréscimo no número de acidentados com motos". "Temos recebido cada vez menos casos - seis desde Janeiro. Os internamentos têm diminuído. Penso que se deve ao facto de as motos serem cada vez mais potentes. As pessoas morrem mais dos acidentes, antes de poderem fazer qualquer reabilitação", referiu a especialista durante a visita, na qual também participou Gonçalo Morais Sarmento, responsável médico do Grande Prémio de Portugal. Por entre inúmeros aparelhos, colchões de exercício, bicicletas estáticas adaptadas aos utentes em cadeira-de-rodas, espaldares e máquinas de levantamento de pesos, Alex Barros e Max Biaggi lá iam distribuindo alguns autógrafos aos seus adeptos. "É óptimo vê-los de perto", confessa Diogo, que está há duas semanas no CMRA, mas ainda tem um longo caminho por percorrer. Tudo se passou em 30 de Abril, na sua Honda CBR de 900 centímetros cúbicos, perto de Alenquer, de onde é natural: uma ultrapassagem a um camião que abortou, uma manobra inesperada do veículo que ia à sua frente e, claro, o excesso de velocidade com que rodava, "para aí uns 80 Km/h ou mais", atiraram-no para o chão. "Aqui sentimos a realidade...toda a gente se pode magoar, até nós. Ouvi dizer que em Portugal se anda muito depressa. Mas se querem emoções e tentar algo mais arriscado, vão para as pistas. Lá não há carros, nem prédios. É mais seguro e controlado", aconselhou Biaggi, de 33 anos e antigo campeão do Mundo de 250cc, apostado em levar alguma "esperança e motivação" aos acidentados. Já na outra metade do ginásio do CMRA, perto das barras paralelas onde se exercita o equilíbrio e a marcha, Rui Soares, de 21 anos e natural de Oeiras, lamenta aquele "cavalinho" que correu mal no último domingo de Páscoa. "Ia na A5 (Cascais-Lisboa) e, ao sacar o cavalo, a roda não caiu direita e...pus-me a inventar. Andar de moto é muito perigoso, mas o gosto é tão grande. Não sei se vou conseguir voltar a mexer o braço, mas se puder vou voltar a andar de moto", afirma, entusiasmado com a presença dos "ídolos, dois pilotos muito bons do Mundial, especialmente o Biaggi". Rui sofreu um arrancamento parcial das raízes do plexo braquial (na zona do pescoço), o que o impede de ter qualquer controlo sobre o seu braço esquerdo. Desloca-se todos os dias a Alcoitão: segundas, quartas e sextas, das 09:00 às 13:00, terças e quintas, das 09:00 às 11:00, para sessões de fisioterapia, após ter superado as dificuldades para encontrar um cirurgião com a solução para a sua rara lesão. O veterano piloto brasileiro Alex Barros, que já anda pelo "circo" das motos de velocidade desde 1986, recordou, por seu turno, a força de vontade que necessitou de ter para recuperar das graves lesões sofridas nas pistas. "Estive durante o ano passado quase todo o tempo a fazer fisioterapia e sei que é muito difícil. É preciso muita fé e força de vontade. Acho incrível a perseverança destas pessoas para voltarem a andar. Espero que esta visita possa trazer mais 橛 astral. Lugar de rua, não é lugar de correr - já dizia o meu pai", revelou. Os afazeres dos mediáticos pilotos obrigaram depois ao regresso ao mundo do "paddock", na pista do Estoril. A hora passada em Alcoitão, entre bengalas, canadianas e próteses, serviu para lembrar o perigo das duas rodas, mas, segundo Biaggi, a maioria das quedas em pista não implicam qualquer lesão. Ao contrário do que sucede nas estradas portuguesas, onde a Brigada de Trânsito da Guarda Nacional Republicana registou um total de 1.945 acidentes rodoviários só na última semana de Agosto, dos quais resultaram 22 mortos, 65 feridos graves e 651 feridos.

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