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14-07-2011

Reflexão de D. António Marcelino sobre "Um mundo de interrogações incómodas mas necessárias".


É inevitável, no agir do dia-a-dia de cada pessoa, o confronto entre os tempos já vividos e os que se vivem agora com o futuro no ...

É inevitável, no agir do dia-a-dia de cada pessoa, o confronto entre os tempos já vividos e os que se vivem agora com o futuro no horizonte. Só no presente podemos ter memória do que se vivemos antes e abertura realista para projectos novos. O presente, porém, aparece-nos cada vez mais confuso e inquietante. Há menos memória, mas mais possibilidades para muitas coisas e mais problemas a enfrentar. São mais difíceis as relações e a comunicação pessoal atenta, pela abundância dos canais massificadores e porque o mundo de muitas pessoas e os valores em causa não coincidem em aspectos essenciais. Toda a gente tem opinião acerca de tudo, do que conhece e do que não conhece. E, quanto menos se conhece, mais se é dogmático nas afirmações e menos respeitador das opiniões alheias. Constroem-se mais muros que pontes, no dia a dia, na política, nas opções desportivas, que só no aspecto religioso se vai notando o contrário. Há mais diplomas de escola, mais festas e passeios de finalistas, mas menos conhecimento de coisas essenciais da vida. Por sistema, alguns vão apagando o passado e pensam, como ideal, um presente de imediatos, sem horizontes, sem projectos que se justifiquem a longo prazo.

Com tudo isto está visivelmente em causa a educação das novas gerações. A educação não é a simples transmissão dos ensinamentos que constam das exigências do currículo escolar. Educar é tudo o que se orienta para ajudar a crescer rumo à maturidade, e que permite optar, com critérios válidos, inserir-se e agir, de modo responsável, na sociedade de que se faz parte. Exige seriedade e competência de quem educa, abertura, acolhimento e esforço do educando, apoio de uma comunidade humana, que é sempre a referência indispensável dos valores morais e éticos que se propõem e transmitem. Reside nisto tudo, quando não é claro, a grande dificuldade do processo educativo que se pretende eficaz nos seus resultados. O processo não tem um termo, ainda que o tenha o curso escolar, porque a necessidade de aprender e de crescer acompanha-nos a todos ao longo da vida.

Na sociedade actual muitos teimam em viver uma vida sem sentido, por isso mesmo cada vez mais empobrecida de humanismo, de ideal, de valores morais, de projectos consistentes. Porque a educação é ambiental, os novos mais facilmente se deixam contagiar pelo vazio das vidas esfrangalhadas e desiludidas do que pelos testemunhos convincentes e sólidos da gente normal. São estes testemunhos que se devem tornar cada vez mais visíveis na família, na escola, nos projectos e conteúdos educativos, nas propostas da sociedade circundante, nas instituições humanitárias.

Nestes dias, jornais e noticiários televisivos deram conta de que está a aumentar, em Portugal, o número de jovens estudantes a partir dos 14 anos, que consomem heroína e outras drogas, antigas e modernas, e que há, também, os que se vão tornando dependentes do álcool. O facto tem muitas leituras que vão sendo feitas consoante os quadrantes ideológicos do analista. O mais urgente nestas e outras situações que afectam alunos das escolas é descobrir as causas e procurar actuar sobre elas.

São estas interrogações incómodas, a que muita gente se furta por não encontrar saída ou pensar que se trata de fenómenos passageiros, que não merecem especial atenção. O exame de interiorização das causas, talvez com a ajuda das vítimas, não pode deixar de fora os pais, os professores, os educadores de todas a vertentes educativas, escolares e outras, os grupos de influência, os meios de comunicação, os lugares de lazer, os traficantes criminosos no caso das drogas tóxicas. Todos são membros desta sociedade cheia de problemas incómodos, que tem, e ainda bem, no seu seio muitas riquezas e oportunidades de bem, nem sempre aproveitadas.


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